Aquilo tudo que a música me diz

Onde estiver, seja lá como for, tenha fé, porque até no lixão nasce flor

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As teorias que explicam o universo, os versos que vasculham o coração. Os garis, estivadores e arquitetos. A fé manipulada dos cristãos. As alegrias, alergias, os afetos, os fatos, frases, a simulação, o país ajoelhado, a morte, o sexo, a culpa e o olhar de acusação.

É sangue mesmo, não é mertiolate. E todos querem ver e comentar a novidade. É tão emocionante um acidente de verdade. Estão todos satisfeitos com o sucesso do desastre. Vai passar na televisão. A televisão me deixou burro, muito burro demais. Agora todas as coisas que eu penso me parecem iguais. Imagens na televisão: mais uma briga de torcidas, acaba tudo em confusão, a multidão enfurecida queimou os carros da polícia. Polícia para quem precisa. Quem quer manter a ordem? Quem quer criar desordem?

Ia pra praia sempre sem chinelo e tinha o peito do pé amarelo. A sola grossa era feito um pneu. Às vezes eu acho que todo preto como eu só quer um terreno no mato, só seu. Sem luxo, descalço, nadar num riacho. Sem fome, pegando as frutas no cacho. É o que eu acho, quero também. Mas em São Paulo, Deus é uma nota de 100. Vida louca. É o rodo cotidiano. Não se anda por onde se gosta. O espaço é curto, quase um curral. Não tem jeito, todo mundo se encosta, my brother. É o cotidiano. Todo dia ela faz tudo sempre igual. Todo dia ela diz que é pra eu me cuidar. Todo dia eu só penso em poder parar. Toda noite ela diz pra eu não me afastar. Anda na pedra, nêga. Anda na pedra que cê seca o pé.

Por quê? Pra que? Em que devo acreditar? Viver sem armas pra lutar. Não crer, não ser, não ter armas pra lutar. Não preciso ser alguém, eu consigo viver sem armas pra lutar. Prosseguir desarmado, suportar desarmado, sem armas pra lutar. É só o amor que conhece o que é verdade. É cuidar que se ganha em se perder. Agora vejo em parte, mas veremos face a face. Filantrópico, samaritano, generoso, tão humano. Acumulando raiva e rancor. Altruísta, complacente, caridoso, tão gente. Acumulando raiva e rancor. Amando o próximo, dizendo a verdade, se arrependendo, dando a outra face. Acumulando raiva e rancor.

Rancor, cisticercose, caxumba, difteria, encefalite, faringite, gripe, leucemia. E o pulso ainda pulsa. E o corpo ainda é pouco.

Vou contar uma história para o povo brasileiro e também pros companheiros que vivem em alto mar. O marujo sai de casa e deixa a família chorando. Os filhos vão se criando sem pegar amor ao pai. Meu filho vai ter nome de santo. Quero o nome mais bonito. Nosso dia vai chegar. Teremos nossa vez. Não é pedir demais: quero justiça. Quero trabalhar em paz. Não é muito o que lhe peço. Eu quero trabalho honesto em vez de escravidão. Quem guarda os portões da fábrica? O que é tudo isso diante da pólvora?

As teorias que explicam o universo, os versos que vasculham o coração. Os garis, estivadores e arquitetos. A fé manipulada dos cristãos. As alegrias, alergias, os afetos, os fatos, frases, a simulação, o país ajoelhado, a morte, o sexo, a culpa e o olhar de acusação. O que é tudo isso diante da pólvora? No beco escuro explode a violência. Mas nada perturba o meu sono pesado. Nada levanta aquele corpo jogado. Nada atrapalha aquele bar ali na esquina. Nada mais me deixa chocado. Nada!

Fé em Deus que ele é justo, irmão. Nunca se esqueça. Na guarda, guerreiro, levanta a cabeça. Onde estiver, seja lá como for, tenha fé, porque até no lixão nasce flor. A esperança não vem do mar nem das antenas de TV. A arte é de viver da fé. Só não se sabe fé em quê.

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