Discoteca criada por Mário de Andrade completa 80 anos

Moozyca foi dar os parabéns a um dos acervos fonográficos mais antigos e ricos do país

Acervo conta com discos de 78rpm, 33rpm e CDs, além de partituras, periódicos, filmes e livros de música

O Moozyca foi dar os parabéns pelos 80 anos da Discoteca Oneyda Alvarenga, no Centro Cultural de São Paulo (CCSP), e ficou de cara com o tesouro que encontrou no local. A coleção conta com diversos títulos de música popular, folclórica e erudita, nacionais e estrangeiros. E boa parte está disponível para consulta e audição! São discos de 78rpm, 33rpm e CDs, além de partituras, periódicos, filmes e livros de música. O destaque, entre outros, é claro, vai para a coleção brasileira de discos de 78rpm.

O clima na discoteca é ótimo e o público é o mais diverso possível - abrange desde maestros que procuram partituras até moradores de rua em busca de lazer. Há também muitos estudantes de música, profissionais da área e admiradores que se deleitam ao encontrar um disco de sua preferência. Os resultados das pesquisas são variados, como trabalhos acadêmicos, artigos de pesquisa, estudos para aulas de música e editais de concurso, programas de rádio e TV e exposições.

Grande literato, grande pesquisador musical

Trânsito, empurra-empurra, fumaça e concreto. Quem anda por São Paulo pode muito bem pensar que a cidade está mais maluca do que nunca. Mas, para Mário de Andrade, já na primeira metade do século vinte, ela já tomava contornos indigestos. Esse retrato da cidade, realizado minuciosamente em palavras, pode ser visto no livro Paulicéia Desvairada, de 1922. Seis anos depois, Mario lançava o livro Macunaíma, o “nosso anti-herói” brasileiro. Tentou destilar a essência do brasileiro e foi muito feliz com o resultado da obra, que o colocou no posto de um dos maiores literatos do país.

Acervo histórico da discoteca (Foto: Divulgação)Porém, o que muita gente não sabe é que Mário não se dedicou apenas à literatura, mas também se debruçou profundamente sobre o mundo da música brasileira. Quando esteve à frente Departamento de Cultura de São Paulo, Mário idealizou a Discoteca Pública Municipal, criada em 1935 e que neste ano completa 80 anos. Localizado no Centro Cultural de São Paulo (CCSP), o acervo histórico foi tombado recentemente pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), com o nome de Discoteca Oneyda Alvarenga – homenagem à crítica musical e colaboradora de Mário de Andrade.

“Por se tratar de uma instituição única na cidade de São Paulo, a primeira no Brasil e das Américas, a Discoteca mantém preservado e disponível um material riquíssimo para pesquisa e consulta pública. São milhares de discos, partituras, livros, periódicos e recortes de jornais na área de música, que podem ser consultados gratuitamente”, afirma Jéssica Aparecida de Matos Barreto, coordenadora da Discoteca Oneyda Alvarenga.

Tesouro vivo

Segundo a coordenadora da discoteca, o papel de Mário de Andrade foi muito importante para o resgate da música nacional, considerado um tesouro vivo. “Sua perspectiva visava o social. Precisava ir a campo cientificamente e conhecer realmente a cultura desse povo por meio de suas manifestações populares. Para tanto, Mário de Andrade realizou grandes projetos e enviou pesquisadores renomados a algumas partes do país para o recolhimento destes registros”, explica.

Quase todo o acervo de 78rpm brasileiros está digitalizado. Esses discos são priorizados por se tratar de um material especialUm dos destaques da Discoteca é a Coleção da Missão de Pesquisas Folclóricas, organizada por Mário de Andrade em 1938. Nesse ano, uma equipe chefiada pelo engenheiro e arquiteto Luís Saia, percorreu o Norte e o Nordeste do Brasil para registrar suas manifestações culturais e folclóricas, em especial de dança e música. Na bagagem, trouxeram instrumentos musicais, objetos de culto, peças utilitárias, fotos, reproduções de desenhos, gravações musicais e filmes.

“A missão passou por Pernambuco, Paraíba, Piauí, Pará e Maranhão. Foram recolhidos objetos, fotografias, gravações sonoras e filmagens de cantigas de roda, tambor-de-crioula, marujos, coco, maracatus,  bumba-meu-boi, coco, sambas, cantigas infantis, canto de carregadores de piano, dentre outros”, conta Jéssica.

Outro arquivo interessante é o registro de vozes de personalidades como Camargo Guarnieri, Dulcina de Morais, João de Souza Lima, José de Alcântara Machado, Lasar Segall e Rubens do Amaral. Constam também gravações de pronúncias regionais do Brasil, para estudo da fonética. São pequenas leituras selecionadas por Manuel Bandeira, feitas por pessoas de todas as regiões do país.

Moderna e acessível

Nos últimos anos, a discoteca está de cara nova, mais moderna e tecnológica, para atrair pesquisadores e amantes da música. Uma das iniciativas para movimentar o acervo foi o projeto Paradas Sonoras, que compreende mais de 70 mil discos e mais de 60 mil partituras, disponíveis digitalmente.

O Paradas Sonoras possui diferentes áreas: estações de pesquisa com busca por autor, intérprete, título, gênero, data, etc; estações de audição de LPs e CDs; estações de audição que permitem que duas pessoas acessem seleções especiais do acervo digitalizado; e estação de audição coletiva, localizada numa área central do CCSP, onde há grande circulação de público.

Tornando-se imortais

Sala de digitalização (Foto: Divulgação)Quase todo o acervo de 78rpm brasileiros está digitalizado. Esses discos são priorizados por se tratar de um material especial – a goma laca, usado para bolachões antigos. O processo de “imortalização” é feito continuamente e também é feito para os discos de 33rpm. A digitalização se dá de acordo com a necessidade de preservação da obra, ou pela intenção de uso imediato de cada disco.

“Quando verificarmos a necessidade, buscamos a obra no acervo, higienizamos e encaminhamos ao nosso laboratório de digitalização, onde o técnico irá usar os programas de computador e aparelhos adequados para o procedimento. O técnico irá retirar o máximo de ruído possível da obra, porém é um trabalho que precisa de muita cautela, pois não devemos interferir na melodia, no timbre do intérprete, ou seja, nas especificidades daquela obra”, explica Jéssica.

Para saber mais sobre discos 78 rpm, veja a entrevista com Bianca Binazzi, radialista e pesquisadora do assunto e uma das idealizadoras do projeto Goma Laca.

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